A Cáritas Arquidiocesana participou, na última sexta-feira, 2, na Câmara de Vereadores de Passo Fundo, de uma Audiência Pública sobre os direitos das pessoas com deficiência. Organizada pelo Conselho Municipal dos Direitos das Pessoas com Deficiência de Passo Fundo - COMPEDE, a atividade contou com o apoio da Comissão de Educação e Bem Estar Social, Conselhos Municipais e Entidades que atuam diretamente com as pessoas com deficiência e entidades parceiras.
Parte da programação dos 16 dias de ativismo pelo fim da violência contra mulheres, a audiência tratou especificamente das mudanças que estão ocorrendo no país que mexem diretamente nos direitos dos trabalhadores e das pessoas com deficiência. Diante da discussão, os participantes se posicionaram, através de carta, contra as medidas retrógradas e conservadoras que estão sendo impostas sobre a população - exemplo disso é a PEC 241/55 que congela os investimentos nas diversas áreas públicas por 20 anos e, ainda, o Decreto nº 8.805/2016, que ataca diretamente os avanços conquistados com o Benefício de Prestação Continuada, o BPC.
Leia na íntegra a carta em defesa dos direitos das pessoas com deficiência:
EM DEFESA DOS DIREITOS DAS PESSOAS COM DEFICIÊNCIA
Audiência Pública sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência
Passo Fundo, 02 de dezembro de 2016
A luta pelo reconhecimento de direitos das pessoas com deficiência é de longa data e tem obtido, com muitos esforços, conquistas significativas ao longo dos anos. Isso foi possível a partir da organização e participação direta das próprias pessoas com deficiência, que juntamente com outros segmentos da sociedade também engajados nesta luta, contribuíram para o avanço da legislação nacional sobre este tema.
Quando em 2008 o Brasil ratificou a Convenção da ONU sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, incorporando-a a sua legislação, assumiu um compromisso permanente na construção de um país com acessibilidade, no sentido mais amplo deste conceito, com reconhecimento e respeito a diversidade das pessoas com deficiência.
A criação do Benefício de Prestação Continuada da Assistência Social (BPC) operacionalizado a partir de 1996, a regulamentação da Aposentadoria Previdenciária das Pessoas com Deficiência em 2013, bem como a alteração na forma de avaliação da deficiência, que passou do modelo médico para o modelo social a partir de 2009, são conquistas significativas neste contexto de avanço dos direitos. As muitas medidas adotadas nas diversas políticas públicas, especialmente com relação a saúde, assistência social, previdência social, habitação, educação e cultura, também vêm desempenhando papel fundamental na melhoria das condições de vida das pessoas com deficiência. Em janeiro de 2016 o Estatuto da Pessoa com Deficiência adquire o status de Lei Brasileira de Inclusão (LBI), reafirmando o compromisso da sociedade brasileira em promover a equiparação de oportunidades, autonomia e acessibilidade a esse segmento da população.
Apesar de todas estas conquistas, é preciso consciência e coragem para reconhecer que ainda há muito que fazer. É preciso avançar muito mais na direção na implementação concreta das medidas previstas na LBI, garantindo que ela não seja somente um marco legislativo, mas que possa materializar um novo tempo sem discriminação e injustiças.
Por isso, é inadmissível que a regulamentação e operacionalização do BPC seja alterada pelo governo sem um amplo debate junto as pessoas com deficiência e outros segmentos da gestão compartilhada da Assistência Social e do controle social. Assim, nos posicionamos contrários ao Decreto Nº 8.805/2016, que ataca severamente os avanços conquistados com o BPC.
Consideramos retrógrados os apelos de determinados grupos conservadores e corporativistas da sociedade brasileira que argumentam pela retomada do modelo de avaliação da deficiência pautado unicamente em conhecimentos biomédicos. Deficiência é parte da existência humana devendo ser compreendida para além das alterações funcionais, considerando especialmente a realidade social das pessoas, os aspectos culturais, de desigualdades socioeconômicas e a existência de barreiras e dificuldades presentes na interação social. O modelo médico não é suficiente para apreensão destes múltiplos aspectos. Somos favoráveis aos avanços na avaliação da deficiência na perspetiva do modelo social.
Por fim, manifestamos nosso repúdio a estagnação dos investimentos em políticas sociais previstos para os próximos anos, em decorrência da PEC 241/55. Sem investimentos nas diversas áreas públicas, os avanços necessários à materialização de políticas voltadas às pessoas com deficiência nas mais diversas áreas não irá ocorrer. É inadmissível que direitos recentemente conquistados sejam inviabilizados, ao mesmo tempo que ainda há tanto a ser buscado para a participação das pessoas com deficiência de forma plena e efetiva, em igualdade de condições com as demais pessoas.
Portanto, nós aqui reunidos nesta Audiência Pública sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, promovida pelo COMPEDE Passo Fundo, nos manifestamos contrários ao Decreto Nº 8.085/2016 e a PEC 241/55, e favoráveis ao fortalecimento do modelo social de avaliação da deficiência. Nenhum direito a menos!