Celebramos São João Maria Vianney, o cura de Ars, nosso patrono. Duas provocações me fazem escrever este texto: a) Os desafios da evangelização no contexto de pandemia, com suas limitações, problemas e o contexto em geral. O período do ministério de Vianney também teve fechamento de igrejas, proibição de culto, perseguição religiosa e epidemia de cólera em1832. b) A leitura do livro deixado por Dom Ercílio Simon: Vita autentica del CURATO DE A’ARS, San Paolo, Milano, 1986, 8ª ed., traduzido do francês, obra de 1981 de René Fourrey, que foi bispo de Belley, de 1955-1975, na qual está Ars. Ele fez uma ampla pesquisa histórica para escrever a biografia de São João Maria Vianney.
O biógrafo não parte da opinião pública, ou da narrativa popular, muitas vezes idealizada e fantasiosa do santo. A biografia não esconde o contexto histórico, nem os dramas pessoais do santo e nem os conflitos e questionamentos dos colegas presbíteros e paroquianos. A poucos dias, o Papa Francisco dirigindo-se aos padres do Colégio São Luís dos franceses disse: “Não deixem as fragilidades de lado: elas são um lugar teológico. (...) Os sacerdotes super-homens terminam mal, todos eles. O sacerdote frágil, que conhece suas fraquezas e fala delas com o Senhor, esse irá bem”.
Vianney foi um padre consciente de suas fragilidades e limitações e do contexto onde vivia, mas isto não o acomodou. Ele desejava fazer o melhor. “O senhor pede tudo e, em troca, oferece a vida verdadeira, a felicidade para a qual fomos criados. Quer-nos santos e espera que não nos resignemos com uma vida medíocre, superficial e indecisa” (Gaudete e Exsultate, n.1).
São João Maria Vianney nasceu em Dardaly 1786; diácono 25/7/1815, presbítero 13/08/1815 ordenado por Dom Claudio Simon; 1ª missa 20/08; vigário paroquial em Ecully de 25/08/1815 a 1818; pároco em Ars de 09/02/1818 até a morte. “O servo de Deus morreu sexta- feira de madrugada, pelas duas horas, a 04 de agosto de 1859, sem agonia e sem violência, consciente até o último suspiro”. Recebeu a Extrema Unção e o Viático.
Do nascimento até a morte o Pe. João Maria viveu numa França muito conturbada, com muitas transformações políticas e religiosas, com suas consequências econômicas e sociais.
Políticas: Vários regimes de governo: absolutismo; Revolução Francesa 1789; Napoleão Bonaparte em 1804 proclama-se imperador e faz guerra em toda Europa, até1815; Restauração com volta da família real até1830, outra revolução para derrubar a realeza.
Religiosas. A Revolução Francesa nacionalizou os bens da Igreja, suprimiu ordens religiosas e fez Constituição civil do clero, onde parte do clero jura fidelidade ao governo, outros não. Vai conflitar e dividir internamente a Igreja por décadas. De 1791 a 1799 têm perseguições religiosas; vários anos as igrejas ficam fechadas, outras são vendidas, padres fogem do país, outros são presos ou executados.
Até iniciar a formação presbiteral, em1806, João Maria, viveu numa Igreja clandestina, sem possibilidade regulares de estudo, de frequentar as missas, de catequese. Ao iniciar a formação, em 1806, foi morar de favor e recebia lições de Balley, pároco de Ecully. Era um “aluno de vinte anos, quase analfabeto”. Balley tinha plena consciência das limitações deste seminarista, mas via nele um vocacionado e disse: “Quanto a ele, o tomarei e me sacrificarei por ele, se for necessário”. João Vianney foi ordenado por causa deste apoio e não decepcionou.
Iniciou a formação presbiteral contra a vontade do pai. Em 1809 João Maria foi convocado para o exército de Napoleão mas ficou doente, desertou e ficou escondido vários meses. Voltou ao seminário depois que seu irmão mais se apresentou no exército em seu lugar. Dele a família não teve mais notícias. Fato que o pai nunca perdoou e por isso sempre se manteve distante do filho.
Os tempos mudam, mas o essencial da vida do pároco permanece. Quando Pe. João Maria iniciou o seu ministério presbiteral o governo já havia mudado a postura em relação à Igreja permitindo que ela realizasse a sua missão. Porém os prédios das igrejas estavam sucateados; o clero “juramentado” e “refratário” vivia em tensão; a catequese precisava ser reiniciada. Anos de uma política de intolerância contra a Igreja e a religião criou-se um ambiente hostil. Além disso, uma população empobrecida em virtude dos conflitos internos e das guerras contra outras nações.
A biografia vai descrevendo amplamente a vida de padre. Foi vigário paroquial do Pe. Balley que o introduziu no ministério progressivamente. O tratava como um noviço que precisava amadurecer e receber tarefas aos poucos. Inicialmente o bispo não tinha dado licença para ensinar na catequese e nem atender confissões.
Os primeiros atos em Ars são assim testemunhados. Ele conciliou o afeto dos seus paroquianos com a sua grande caridade, a grande bondade e as numerosas visitas que fazia. Também teve que iniciar a reforma da igreja, que chamava “a casa do bom Deus”.
Preocupado com a falta de escola, inicia a obra Providence. Com o passar do tempo vai se tornando também internado de pobres e órfãos. O desafio constante era a manutenção. Anos depois a obra foi confiada a religiosas e outra escola aos Irmãos da Sagrada Família.
A partir de 1830 começam as peregrinações de fiéis para se confessarem com o pároco de Ars. Um novo desafio a ser enfrentado. Os fiéis reconhecem este carisma no Pe. Vianney e ele colocou este dom à disposição dos que o procuravam.
São João Maria Vianney com sua austeridade, ensinamentos catequéticos, vida de oração e zelo pastoral é um facho de luz para o exercício do nosso ministério presbiteral. Que ele interceda por nós. São João Maria Vianney, rogai por nós.
Dom Rodolfo Luís Weber