Caminhar, calcorrear, jordanear, peregrinar, são verbos que indicam a ação, o ir e vir, a pé, de um ponto à outro. Dar passos, constitui uma atitude humana desenvolvida, quase que em sua totalidade, antes mesmo da vocalização de expressões, de palavras ou frases. A criança aprende caminhar, e então desenvolve, com habilidade maior, articular palavras, geralmente. São processos humanos próprios que exigem estímulo natural e relacional.
A quaresma, na vida cristã, é um caminho percorrido passo-a-passo para a Páscoa. Quem caminha são as pessoas, como percurso de preparação à festa da esperança, a ressurreição de Jesus Cristo. O caminho é, para além de um trajeto, um projeto de vida à seguir. Por diversas vezes a sagrada escritura recorda o chamado ao seguimento: “Vem e segue-me!”
A Via Crúcis, do latim caminho da cruz, também nominada Via Sacra, faz referência ao caminho percorrido por Jesus, ao carregar a cruz, entre o Pretório e o Gólgota, Monte Calvário, onde se deu a crucificação. Tradição cristã, a Via Sacra, transpõe-nos o exercício espiritual de seguir os passos de Jesus, revisitando sua vida, paixão, morte à ressurreição. Ação sagrada aos cristãos, especialmente, adultos e anciãos.
A juventude calcorrea a quaresma pela Via Sacra? Sim e não! Por quê? Cada grupo de jovens, cada comunidade, cada região, cada realidade guarda seus contextos e experiências, entende? A Via Sacra, enquanto exercício espiritual, é originária do século XI, quando ocorriam as peregrinações pelos locais sacros da Terra Santa. Os cristãos trouxeram para o ocidente a intenção de reviver o caminho sagrado através das estações que, inicialmente eram 14 e, mais tarde, através de João Paulo II, chegou-se a 15ª estação, referente a ressurreição.
Peregrinar o caminho implica dar-lhe um significado importante. A Campanha da Fraternidade Ecumênica (CFE), neste 2021, sugere que o caminho da fraternidade é o diálogo enquanto compromisso de amor, pois, compreende que “Cristo é a nossa paz: do que era dividido, fez uma unidade” (Ef 2,14a). Caminhar com Jesus Cristo, seja na experiência espiritual da Via Sacra, seja na realidade contemporânea da condenação, flagelação, crucificação e martírio juvenil, implica um compromisso de amor que exige diálogo e unidade na diversidade.
O texto base da CFE 2021 retrata significativos índices de violência à juventude brasileira. “No ano de 2018, foram assassinados no Brasil 30.873 jovens, ou seja, tivemos uma taxa de 60,4 homicídios para cada 100 mil jovens e 53,3% do total de homicídios do país” (n. 59). É preciso ressaltar que os homicídios são a principal causa dos óbitos da juventude, especialmente masculina. Atualmente, para além da pandemia que devasta vidas, a Via Sacra do presente segue crucificando a juventude, a culpabilizando.
O caminhar quaresmal, hoje, muito mais que nos séculos de outrora, exige aos cristãos e às cristãs, reconfigurar-se ao Cristo Ressuscitado para que, como reza a oração da CFE 2021, se possa “testemunhar a beleza do diálogo como compromisso de amor, criando pontes que unem em vez de muros que separam e geram indiferença e ódio”. Jordanear caminhos, neste tempo presente, requer reaprender o itinerário dos primeiros cristãos, conhecidos como “seguidores do caminho”. Peregrinar para conversão, então.
A Via Lucis, ou Caminho da Luz, resgata-nos à esperança de um peregrinar alternativo à vida em abundância (Jo 10,10). Neste andejar faz-se memória ao Cristo Crucificado Ressuscitado a partir da ressurreição ao pentecostes, seguindo a construção da Civilização do Amor, com novos céus e nova terra (2Pd 3,13-14). Se caminhar é preciso, portanto, caminhamos unidos(as) na beleza da diversidade, pelas “veredas da amorosidade” a testemunhar o amor redentor de Jesus Cristo. Com a juventude, “caminhamos pela luz de Deus”, a peregrinar o esperançar, pois, “agora o que mais importa é renascer na esperança!”