A Quaresma marca a primeira parada que faremos, ao longo deste ano, dentro do estudo dos Cadernos do Concílio. Os quarenta dias vão desde a Quarta-Feira de Cinzas até a Quinta-feira da Semana Santa. Os números 109 e 110 da Constituição Sacrosanctum Concilium expressam o olhar dos padres conciliares sobre este tempo litúrgico, sendo uma referência importante para a caminhada litúrgica da Igreja até os dias de hoje.
Inspiração bíblica
O surgimento do calendário litúrgico remonta os primeiros séculos e sua inspiração é bíblica. O desejo de vivenciar o Mistério Pascal da vida, paixão, morte e ressurreição de Cristo em todas as suas dimensões levou a Igreja a contemplar o movimento de abandono da idolatria e adesão à Aliança e ao Reino de Deus. A passagem bíblica central para o uso da imagem dos quarenta dias é a prática de Jesus, com o jejum e enfrentamento das tentações no início de sua missão, elemento presente nos três evangelhos sinóticos (Mateus, Marcos e Lucas).
A Palavra de Deus nos fornece outras inspirações ligadas a este número de dias: os quarenta dias do dilúvio (Gn 7,17-20); os quarenta anos do povo de Deus no deserto (Dt 2,7); os quarenta dias de Moisés no Monte Sinai (Ex 24,12-18.34); os quarenta dias em que Jonas pregou aos habitantes de Nínive (Jn 3,4-10), entre outros.
Principais elementos da Quaresma
A espiritualidade da Quaresma, segundo o Concílio Vaticano II, é baseada em um caminho composto por quatro elementos centrais. O Batismo é o primeiro deles, compreendendo a preparação dos catecúmenos e a retomada dos elementos centrais da fé aos batizados. Cabe recordar que, nas primeiras comunidades cristãs, a quaresma marcava a “reta final” de preparação para o Batismo, o qual costumava ser celebrado unicamente na Vigília Pascal. Nos dias de hoje este é o dia por excelência do Batismo, onde também acontece a renovação das promessas batismais dos cristãos que já integram a comunidade de fé.
A penitência constitui um segundo acento quaresmal. Sabendo da necessidade de um jejum interno e externo, o Concílio Vaticano II sublinhou a necessária ligação entre o significado pessoal e social do pecado. Em suas palavras: “A penitência quaresmal deve ser também externa e social, que não só interna e individual. Estimule-se a prática da penitência, adaptada ao nosso tempo […]” (SC 110). Neste sentido, em nosso país, a Campanha da Fraternidade procura dar concretude a esse pedido da Igreja.
A Palavra de Deus é outra marca deste tempo. A escolha dos textos litúrgicos considera os dois elementos anteriores, na esteira de uma profunda catequese batismal e com o apelo à conversão. Este acento também aparece no caráter bíblico dos cantos propostos para este tempo, nos símbolos e sinais (cinzas, cruz…), na sobriedade das ações litúrgicas.
A última chave de interpretação da Quaresma apresentada neste trecho da Sacrosanctum Concilium é a oração. Mirando o objetivo de preparar os cristãos para a Páscoa, a prática da oração aparece como uma forma dos fiéis se aproximarem do Mistério de Cristo, compreendendo mais profundamente a doação da sua vida e aproximando este acontecimento salvífico de sua própria realidade: as dores, cruzes e alegrias pessoais e do povo de Deus.
“Eis o tempo de conversão!” Vivendo este tempo especial, vamos prosseguir esta formação. Logo mais nos encontraremos para refletir sobre a Via-Sacra!